Reportagens 01.09.2022

Saúde e ciência para a comunidade

O que a primeira turma do Repórter Paraisópolis viveu para criar a revista +SQ

por Redação +SQ

O jornalismo comunitário é aquele feito por e para moradores de uma comunidade. É uma maneira de o jornalista abordar problemas e soluções locais que afetam não somente a si, mas também familiares, amigos e vizinhos. Assim, criam-se espaços para a publicação de pautas que, embora fundamentais, têm dificuldade em conquistar espaço em veículos tradicionais.

Ter conhecimentos de comunicação e de jornalismo faz toda a diferença na hora de encontrar histórias relevantes e, após uma boa apuração — quando se descobre se as informações fazem sentido —disponibilizá-las e distribuí-las ao público. O projeto Repórter Paraisópolis cria meios para que essa aproximação entre jovens moradores da comunidade e o conhecimento jornalístico aconteça. Os participantes que estão nesta edição têm de 17 a 23 anos, com trajetórias distintas e particulares, cada um com seus sonhos e objetivos, mas em comum a vontade de melhor informar as pessoas que vivem em Paraisópolis.

Concebido pela Comunicação Institucional do Einstein e realizado em parceria com o Programa Einstein na Comunidade de Paraisópolis (PECP), gerido pelo Voluntariado da organização, o programa se deu entre abril e julho, com encontros às terças e quintas-feiras pela tarde. Ao longo desse período, houve aulas sobre jornalismo, saúde e ciência.

O resultado dessa jornada você confere nas próximas páginas, com reportagens sugeridas, apuradas e escritas pelos jovens da comunidade participantes do projeto.

“Foi uma experiência incrível ter essa relação tão próxima com esses jovens, que trouxeram toda sua vivência, as necessidades, e uma vontade enorme de ajudar a transformar a realidade da saúde da população por meio da boa informação”, afirma Debora Pratali, diretora de Comunicação Institucional do Einstein e idealizadora do projeto.

“Iniciativas como essa reforçam nosso propósito e fomentam a evolução dos jovens, para que tenham um futuro mais justo e igualitário. O PECP atua há mais de 23 anos transformando vidas, sendo resultado de muito esforço, união e o apoio integral do nosso time de voluntários, colaboradores e parceiros, como a Comunicação Institucional do Einstein, que investe e acredita no nosso trabalho”, diz Telma Sobolh, presidente do Voluntariado Einstein.

Passamos por assuntos primordiais e inerentes à atividade jornalística, como pauta, apuração e entrevista; investigamos a estrutura de uma reportagem (do lide à conclusão), passando pelo texto na forma da pirâmide invertida; desenvolvemos conceitos como objetividade e imparcialidade, sem deixar de lado o debate por trás desses últimos.

Aula de oratória com a jornalista e apresentadora Cássia Miguel
Vivian Avelino, infectologista e pesquisadora do Einstein, foi entrevistada sobre vacinas e infecções sexualmente transmissíveis

Falamos do SUS, o Sistema Único de Saúde. “A saúde é direito de todos e dever do Estado”, trecho do artigo 196 da Constituição Federal de 1988, tornou-se lema. Vimos como o SUS se formou, o que ele faz, qual sua estrutura e como era o atendimento à população antes dele.

Em busca de pautas

Com vistas ao jornalismo de saúde, também passamos pelos caminhos que uma repórter faz para encontrar possíveis fontes, pautas e dados para suas matérias, do Datasus às assessorias de imprensa em organizações médicas e acadêmicas. Artigos científicos também estiveram no centro das atenções em uma das aulas. Especificamente, estudamos como lidar com esse tipo de texto, qual sua estrutura e que informações ele traz.

Aprendemos ainda a analisar perfis de pessoas a serem entrevistadas (as fontes, no jargão jornalístico), e como ouvi-las.

Como o jornalismo é uma atividade essencialmente prática, a produção de atividades era frequente, de entrevistas entre os colegas a exercícios de interpretação de texto e gramática.

Os participantes do Repórter Paraisópolis também assumiram o comando de duas entrevistas coletivas, uma com profissionais de saúde da UBS Paraisópolis 3 e CAPS Paraisópolis (psicóloga, médico, e enfermeira) e outra com Vivian Avelino, infectologista e pesquisadora do Einstein, e Luiz Vicente Rizzo, imunologista e diretor de pesquisa do Einstein.

Em outra atividade, os jovens sugeriram pautas e as fontes para as matérias. Noutra, distribuímos textos jornalísticos e eles tinham que, primeiro, identificar os erros gramaticais, colocados lá por nós, e depois dizer qual o método usado pela pesquisa cientifica relatada na reportagem.

Para conhecer as demandas da população de Paraisópolis e o que eles gostariam de saber sobre saúde e ciência, fizemos um “fala, povo”. Esse é um tipo de apuração em que o jornalista vai às ruas e entrevista quem passa por lá. As pessoas querem saber de tudo, de depressão a AVC (acidente vascular cerebral). Adquirir conhecimento na interação com profissionais foi fundamental para o projeto. A madrinha da primeira turma do Repórter Paraisópolis, Cláudia Collucci, jornalista de saúde da Folha de S.Paulo, nos trouxe sua experiência.

Cláudia Collucci, repórter da Folha de S.Paulo (de vermelho, ao centro), conversou com participantes sobre temas de reportagens desta edição

Foi gratificante fazer parte do projeto e manter a nossa quebrada informada sobre saúde e ciência.

Thaís Nascimento, participante

Ela foi ao PECP falar com os jovens sobre sua trajetória, além de discutir com eles as pautas que estão nesta edição da +SQ. A reta final do curso se deu justamente com a produção dessas reportagens.

Também aconteceram outras conversas enriquecedoras, uma delas com Vagner de Alencar, jornalista, criador da Agência Mural e que morou em Paraisópolis por muitos anos. Outro convidado foi Valter Rege, cineasta e influenciador que trouxe um pouco de sua trajetória, um homem negro, gay e periférico.

O jornalista Vagner de Alencar, que morou em Paraisópolis e fundou a Agência Mural, divide sua trajetória com os participantes do projeto
O cineasta e influenciador Valter Rege explicou a dinâmica do trabalho com redes sociais

Esteve presente também o fotógrafo Rodrigo Zaim, para falar de sua história e do olhar sensível do fotojornalista, e a jornalista Cássia Miguel, que ensinou sobre como falar bem em público e em vídeos.

Os participantes prepararam perguntas e entrevistaram fontes, como cardiologistas, psiquiatras, psicólogos, enfermeiros e neurocientistas, além de moradores do bairro. Com base no que vivem e no que apuraram, eles escolheram as pautas que queriam fazer.

Se no começo do programa eles tinham vergonha (e até medo) de falar com um especialista, no final eles demonstraram desenvoltura para conduzir as entrevistas. A evolução da qualidade do texto também foi visível.

“Gostei muito da experiência, consegui entender a dimensão da comunicação. Foi gratificante fazer parte do projeto e manter a nossa quebrada informada sobre saúde e ciência, até porque a informação não chega para todos. Gostei muito de entrevistar os médicos, aprender direto das fontes e transformar todo o conteúdo que aprendemos em matérias jornalísticas diretas e acessíveis para os moradores de Paraisópolis”, disse Thais Nascimento, 23 anos, uma das participantes.

Hoje é possível dizer que esses jovens que se destacaram na primeira turma do Repórter Paraisópolis estão muito mais preparados para se comunicar, para apurar e reportar informações relevantes para familiares, amigos, vizinhos e todos nós. Que orgulho!

Membros do Repórter Paraisópolis em entrevista coletiva com profissionais do SUS na UBS Paraisópolis 3

Caroline Carmo, 20

Natural do Paraná, Caroline Carmo vive há oito anos em Paraisópolis. Ela mora com a mãe, o irmão e a cunhada. Antes, havia também o pai, que faleceu no começo de 2022. A perda os aproximou e deu forças. Dele, Caroline puxou a personalidade. “Sou uma mulher forte, que flui com a vida mas sabe o que faz que tem seu próprio pensamento e opinião.”

Julia Lima, 17

Julia é mais madura do que a idade revela. Tornou-se responsável por si mesma aos 12, o que a privou de certas experiências da infância e da adolescência. “Sinto falta de poder ser frágil”, diz. Em Paraisópolis, ela conta que viveu momentos memoráveis e tristes. Entre boas e más lembranças, Julia abre caminhos e conquista seu espaço com perseverança.

Thaís Nascimento, 23

Os sonhos de Thaís pavimentam o caminho rumo ao seu objetivo: sentir-se feliz e realizada com o que gosta de fazer, “a arte da comunicação”, como ela diz. Eles, no entanto, não são só para ela. Thaís quer incentivar outras pessoas a sonharem e proporcionar melhor qualidade de vida aos seus pais.

Elisa Ferreira, 22

Curiosa por aprender, Elisa entrou para o Repórter Paraisópolis porque quer levar para a comunidade notícias de utilidade pública. Ela conta que, assim, pode incentivar familiares e amigos a se prevenir e se tratar de doenças. Essa vontade condiz com um de seus sonhos, que é ajudar pessoas carentes. No tempo livre, Elisa gosta de cantar e conversar.

Raphaela Oliveira, 18

As ações sociais são uma forma de Raphaela demonstrar seu amor pelo próximo. Ela coleta e distribui doações, comida, roupas e produtos de higiene, que chegam às mãos de quem precisa. Antes do curso, Raphaela se questionava se realmente queria seguir a carreira de jornalista. Depois dele, diz não restar dúvidas “Com certeza!”

Willamy Barbosa, 18

O violinista de Paraisópolis supera os obstáculos que aparecem à sua frente. Willamy não era tão bom quanto os colegas das aulas de música. Com estudo e prática, tornou-se um músico de primeira. Entrou para o projeto para desenvolver a escrita e a oratória, que serão também importantes no futuro, quando se tornar um advogado.

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