Reportagens 31.08.2022

Quando falta absorvente

Mulheres se sentem constrangidas e recorrem a formas alternativas para conter o sangue da menstruação

por Júlia Lima

Uma mulher gasta em média R$ 18 com absorventes por ciclo menstrual. Se ela for mãe e tiver uma filha, por exemplo, o montante dobra. O custo pode passar dos R$ 10 mil ao longo da vida. Mas nem todas as mulheres têm esse dinheiro, ainda mais em famílias cuja renda é de um salário mínimo ou que recebem o Auxílio Brasil.


28% Das mulheres de baixa renda têm dificuldade para comprar absorvente

1 em cada 4 meninas brasileiras deixa de ir à escola por falta dos itens de higiene no período menstrual. Com isso, elas chegam a perder 45 dias do ano letivo

Uma pesquisa de uma marca de absorventes indica que 28% das mulheres de baixa renda são afetadas diretamente por essa carência. Como elas nem sempre têm acesso aos produtos de higiene íntima devido às dificuldades financeiras, acabam recorrendo a formas alternativas e inadequadas para conter o sangue da menstruação — como miolo de pão, jornal, sacolas etc.

Essa situação pode ser definida como “pobreza menstrual”, e ocorre quando uma menina ou mulher não tem acesso a itens de higiene, como absorvente, sabonete, água e papel, ou vive sem saneamento básico. O estudo também diz que uma em cada quatro meninas deixa de ir à escola por falta dos itens de higiene no período menstrual. Em média, são 45 dias de falta no ano letivo.

“Elas se sentem violentadas porque às vezes tem uma mancha ali na roupa e alguém aponta, olha torto, faz cara de nojo”, diz a psicóloga Maíra Rodrigues, da UBS Paraisópolis 2. Isso traz impactos à saúde mental de mulheres e meninas. “Elas ficam com baixa autoestima porque se sentem constrangidas em falar que não têm o básico para a higiene.”

Outro estudo, do Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), aponta que, no Brasil, são 713 mil meninas sem acesso a banheiro ou chuveiro em seu domicílio e mais de 4 milhões sem acesso a recursos de cuidado menstrual nas escolas.

Problemas e soluções

Sem acesso a itens básicos de higiene, mulheres e meninas podem ter sérios problemas de saúde, explica a ginecologista Vanessa Alvarenga, do Hospital Israelita Albert Einstein. “Pode haver infecções como candidíase, hepatite, cistite, infecções renais. Se as infecções forem persistentes, pode haver lesões na pele.”


Foi a partir de relatos que ouvia diariamente das mulheres de Paraisópolis que Flávia Rodrigues, 24 anos, presidente da Associação das Mulheres de Paraisópolis (AMP), criou a campanha “Meu Fluxo Livre”, que doa kits de higiene pessoal para as mulheres da favela em situação de vulnerabilidade social.

O grupo, que organiza a coleta e a doação de itens, é formado por mães, trabalhadoras e voluntárias que criam estratégias em busca de alimentos, profissionalização e oportunidades de emprego. “A ideia é ter uma iniciativa que acolha as dores das mulheres de Paraisópolis e outras favelas, e poder ajudá-las e encorajá-las a falarem sobre o tema sem vergonha”, diz Flávia.

A ideia é ter uma iniciativa que acolha as dores das mulheres de Paraisópolis e outras favelas, e poder ajudá-las e encorajá-las a falarem sobre o tema sem vergonha

Flávia Rodrigues, criadora da campanha Meu Fluxo Livre

FOTOS Fábio H. Mendes

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