

por Matheus Amaral
O morador de Paraisópolis Antônio Rodrigues Moreira — o “seu Moreira” —, hoje com 72 anos, tomou seu primeiro gole de álcool aos 14. Mas as bebidas viraram um problema maior a partir dos 21 anos, quando ele chegou em São Paulo, vindo de Pedra Branca, no Ceará. “Eu trabalhava só para comprar as coisas de casa, e o resto eu gastava na bebida”, lembra. “A vida de quem abusa do álcool é uma autodestruição.”
Entre 2010 e 2021, foi registrado na cidade de São Paulo o aumento de 5% em internações decorrentes da dependência por álcool, segundo dados da prefeitura. É comum ver adolescentes com acesso a bebidas,
antes mesmo de alcançarem os 18 anos. Os jovens são mais vulneráveis a criar dependência, segundo Gabriel Garcia Okuda, médico psiquiatra do Hospital Israelita Albert Einstein. “O álcool afeta o desenvolvimento
cerebral e pode causar problemas graves futuramente”, afirma.
Aceitação social
“O álcool é a droga mais usada no mundo. Estamos acostumados com piadas envolvendo pessoas bêbadas e até fazemos pouco caso de quem dirige alcoolizado”, afirma o especialista. Esse cenário, que é potencializado por propagandas contínuas, passa a mensagem de que as bebidas alcoólicas não são tão danosas. Nada disso!
Segundo pesquisas recentes, não existe uma dose segura de álcool. Claro que, quanto maior a ingestão, pior. Mas, no longo prazo, mesmo o consumo moderado aumenta o risco de problemas como o câncer.
Isso significa que maiores de 18 anos não podem tomar uma gota de álcool? Não, até porque essa é uma decisão individual. Porém todos devem entender que há riscos por trás daquela cervejinha no fim de semana — um deles é a dependência.
Além das alterações de humor e da busca contínua por bebidas, pessoas alcoolizadas correm um risco maior
de se envolver em situações de violência e em acidentes. Um estudo de 2022 da Universidade de São Paulo indica que, entre os internados por traumas no Hospital das Clínicas, 23% tomaram álcool — foi a droga mais associada a essas tragédias.
Principalmente em casos mais graves de dependência, abandonar o álcool pode ser bastante desafiador, e até gerar reações adversas significativas. Daí a importância de buscar a ajuda profissional. “É possível oferecer suporte psicológico, terapias de grupo, reposição de vitaminas e até uso de calmantes, a depender de cada caso”, ilustra Okuda.
O apoio familiar também é fundamental. Graças a parentes e a uma entidade religiosa, seu Moreira parou de beber aos 48 anos, mais de três décadas depois do primeiro gole.
“Hoje eu tenho paz e também a maior riqueza, que é a saúde”, afirma o aposentado, sóbrio há 24 anos.
A paz à qual seu Moreira se refere passa pelo bem-estar mental. Até porque, entre os problemas do abuso de álcool, estão crises de ansiedade e piora de quadros psiquiátricos. “Tentativas de suicídio são mais comuns quando o paciente está sob o efeito de álcool”, complementa Okuda.
Ajuda à disposição no SUS
O Centro de Atenção Psicossocial (CAPS) de Paraisópolis possui serviços para amparar pessoas com diferentes dependências, inclusive por álcool. Há até grupos de apoio para que o indivíduo que se encontra nessa
situação consiga se expressar — e ser acolhido por profissionais e outros indivíduos que já vivenciaram esse problema.
“É importante ter esse mecanismo de suporte e de um acompanhamento mais próximo pelos terapeutas”, afirma Okuda. Durante o tratamento de uma dependência, em geral há percalços e recaídas. Mas, com acolhimento, fica mais fácil superar esses desafios. ■